PRORROGAÇÃO DO PRAZO DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO DOS PÓLOS RODOVIÁRIOS DO PECR–RS – PEDÁGIOS
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C O N S U LT A
A Associação dos Usuários de Rodovias Concedidas/Serra – ASSURCON – apresenta uma síntese histórica da instituição do Programa Estadual de Concessão Rodoviária – PECR/RS – e consulta-nos, formulando os seguintes tópicos:
1. Os atuais contratos de concessões rodoviárias recém chegaram à metade do prazo contratado, restando ainda oito anos para seu término;
2. Os contratos foram firmados com data de início e data de término já definidas, sem previsão de prorrogação;
3. Todo o processo das concessões rodoviárias através dos Pólos de pedágios, para nós usuários, foi nebuloso e pernicioso, sendo a prorrogação um dos sonhos, apresentado desde o início das concessões;
4. O fato novo é a atual Administração Estadual ter assumido de fato a condição de procuradora do sempre manifesto desejo das concessionárias dos Pólos de pedágios de ter seus contratos prorrogados pelo maior número de anos possível.
A ASSURCON/SERRA solicita ao Escritório de Advocacia “Gravina Advogados” parecer jurídico que possa embasar ações da mesma junto ao Governo do Estado, a Assembléia Legislativa Estadual e ao próprio Ministério Público.
Ante a estes questionamentos, em temas de contratação administrativa e concessão de serviços públicos, passamos ao exame dos tópicos destacados pela consulente, todos relacionados ao prazo de vigência contratual.
P A R E C E R
O direito à prorrogação do contrato administrativo de concessão de serviço público está relacionado na Constituição Federal, através de um comando ao Poder Público, para disciplinar a matéria através de lei.
Constituição Federal
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos:
Parágrafo único. A lei disporá sobre:
I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; (grifamos)
II – os direitos dos usuários;
III – política tarifária;
IV – a obrigação de manter serviço adequado.”
Em atenção à diretriz constitucional, a Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, ao dispor sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, definiu um conteúdo mínimo, indispensável a esses contratos, considerando cláusula essencial aquela relativa às condições de prorrogação:
Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.
“Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas:
XII – às condições para a prorrogação do contrato;” (grifamos)
Com base na estrutura federativa e na respectiva competência conferida aos Estados, o Rio Grande do Sul editou a sua própria lei sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos (Lei 10.086, de 24 de janeiro de 1994).
Como se observa, um ano antes da Lei nacional, a lei gaúcha (Lei 10.086/1994) contemplou normas sobre as cláusulas essenciais do contrato, admitindo a prorrogação contratual, desde que prevista em lei específica e no edital de licitação:
Lei 10.086, de 24 de janeiro de 1994.
“Art. 6º - Toda a concessão dependerá de lei específica que a autorize e discrimine os seguintes elementos:
I – O prazo da concessão;
...
Art. 9º - São cláusulas essenciais do contrato, no que for aplicável, as relativas a:
...
XII – condições para prorrogação do contrato, desde que previstas no edital de licitação;” (grifamos)
Em acatamento ao disposto no mencionado art. 6º da Lei 10.086/1994, foram aprovadas as leis de concessão dos pólos, que autorizam o Poder Executivo a conceder os serviços de operação, exploração, conservação, manutenção, melhoramentos e ampliação de rodovias integrantes do Sistema Rodoviário Estadual, pertencentes ao denominado Pólo de Concessão Rodoviária, as quais previram prazo de concessão de quinze anos. Por modelo, tomou-se a Lei Estadual 10.705/1996, do Pólo de Caxias do Sul:
Lei 10.705, de 12 de janeiro de 1996.
“Art. 3º O prazo de concessão será de quinze anos.”
Com relação ao prazo de vigência, essa mesma orientação foi mantida nas demais leis do Programa Estadual de Concessão Rodoviária/RS - (Pólos): Leis 10.698; 10.699; 10.699; 10.700; 10.701; 10.702; 10.703; 10.704 e 10.706, todas de 12.01.1996.
Para situar esta consulta no contexto do ordenamento jurídico vigente, destacamos o conjunto de leis acima, que permitem o exame sistematizado de nossas respostas.
Também, à luz desse contexto normativo, passamos à análise dos fatos e atos jurídicos ocorridos no âmbito do programa de concessão de rodovias do Estado do Rio Grande do Sul.
ANÁLISE DOS FATOS
Em 12 de novembro de 1996, O Eng. José Luiz Rocha Paiva, Diretor Geral do DAER, assinou o Edital de Pré-Qualificação 75/96 (Pólo de Caxias do Sul, tomado por exemplo).
No item 3 – Prazo da Concessão –, constou:
“3.1 – O prazo fixado para a concretização do Objeto deste Edital é de 15 (quinze) anos, podendo, contudo, ser prorrogado até igual período, desde que atenda ao interesse público e as necessidades ditadas pelo valor dos investimentos.”
Prestando-se atenção aos demais procedimentos da licitação do Pólo de Caxias do Sul (igual aos demais), nos deparamos com o Edital de Convocação 75/96, da citada Licitação na modalidade de Concorrência, do mesmo Diretor Geral do DAER, com a data de 15 de julho de 1997.
Este o real Edital da Concorrência - de 15.07.1997 - com os seus anexos: Tabela de Pontuação; Minuta do Contrato de Concessão; Estrutura Tarifária; Termo de Referência para Elaboração do Volume 2 da Proposta Técnica; Termo de referência para Elaboração da proposta Comercial; Modelo de Carta de Participação; Modelo de Atestado de Exeqüibilidade Econômico-financeira; Modelo de Carta de Intenção para Captação de Recursos por instituição financeira; Modelo de Atestado de Adequabilidade e Viabilidade do Programa de Seguros; Modelo de Carta de Intenção para Colocação de Papéis; Modelo de Carta de Oferta e Descrição das Rodovias que compõem o objeto da licitação.
Quanto ao prazo do contrato, o Edital de Convocação 75/96 deixou de mencionar expressamente a sua fixação e as condições para a prorrogação, remetendo o dispositivo para a Minuta do Contrato, anexa.
A Minuta do Contrato, ao contrário do que havia sido previsto no item 3.1 do Edital de Pré-Qualificação 75/96, deu nova redação:
“3- Prazos de Concessão
3.1 – Prazo Total: O prazo da concessão é de 15(quinze) anos, excepcionados os casos expressamente previstos neste CONTRATO.”
O Contrato de Concessão do Pólo de Caxias do Sul (tomado por exemplo) foi celebrado em 14 de abril de 1998, conforme acima transcrito, definindo o prazo de quinze anos, com exceção para outros casos expressamente previstos no instrumento contratual.
Conseguimos identificá-los como sendo os das seguintes cláusulas contratuais:
“2.3.4 – Os prazos suspensos serão restituídos, procedendo-se os ajustes necessários nos cronogramas das obras e dos serviços afetados;” (grifamos)
“5.3.6 – Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso da Concessionária, quando motivada:
I- por razões de segurança de pessoas e bens;
II- caso fortuito ou força maior.” (grifamos)
“5.3.7- A interrupção da prestação do serviço nos casos aludidos no item anterior não implica em prorrogação da concessão, salvo no caso do inciso II, com a ocorrência da prorrogação pelo mesmo tempo de interrupção.” (grifamos)
As exceções retro não cuidam de prorrogação de prazo. Trata-se de cláusulas de «restituição de prazo», para o fim de assegurar o cumprimento da integralidade dos 15 (quinze) anos de concessão.
Tais hipóteses encontram amparo nas leis de Concessões e de Licitações, e estão reservadas para situações anômalas, excepcionais, eventos invulgares, ou então as decorrentes das chamadas sujeições imprevistas «teoria da imprevisão», desde que não haja alteração do objeto do contrato. Sua adaptação, nesses casos, independe de autorização da Assembléia Legislativa ou de previsão contratual.
Isso mostra que tais exceções não correspondem ao tipo de «prorrogação de contratos administrativos» citada na Constituição Federal e nas Leis que fundamentam este parecer.
Não encontramos nenhuma outra hipótese de alteração ou prorrogação no contrato. Sendo assim, os mesmos deverão se extinguir quando completarem os 15 (quinze) anos de vigência contratual.
DA PREVALÊNCIA DAS LEIS ESTADUAIS DOS PÓLOS
Sobrepondo-se a esta análise dos instrumentos contratuais, estão as Leis Estaduais, criadoras de cada um dos Pólos ([1]).
Estas leis, além de definirem com precisão o objeto de cada um dos contratos de concessão, fixaram o termo final de forma estanque, definindo o prazo de quinze anos, sem admitir prorrogação.
Assim, a autorização legal conferida pela Assembléia Legislativa, a ser cumprida pelo DAER na publicação do Edital de Concorrência, foi rígida ao dispor o prazo de 15 (quinze) anos para cada um dos contratos (modelo do estudo – Lei 10.705/96, art. 3º).
LEI N. 10.705, DE 12 DE JANEIRO DE 1996
Autoriza o Poder Conceder Executivo a conceder os serviços de operação e exploração, conservação, manutenção, melhoramentos e ampliação de rodovias integrantes do Sistema Rodoviário Estadual e pertencentes ao complexo de obras ou serviços denominado Pólo de Concessão Rodoviária – Caxias do Sul/RS.
Cópia desta Lei foi juntada a este parecer. A sua leitura elucidará muitas dúvidas.
Cumpria ao DAER, na cláusula contratual sobre o prazo, transcrever, integralmente, o que a Lei determinou e nada mais:
“Art. 3º. O prazo da concessão será de quinze anos”
De tal forma, alterações produzidas pelo DAER - no Edital e nos contratos celebrados -, após a explicitada e restritiva autorização legislativa, estão sujeitas a exame, para apurar a sua ineficácia ou nulidade.
O legislador, diante do projeto de lei do Executivo e de todos os anexos elaborados pelo DAER, não quis e não manifestou nenhuma intenção de permitir a prorrogação dos contratos.
Essa intenção restritiva ficou clara nas Leis criadoras dos Pólos. Das duas propostas iniciais do DAER, nenhuma teve aprovação dos Deputados: a primeira, dos editais de pré-qualificação, que pretendeu a prorrogação por igual período, desde que atendesse ao interesse público e as necessidades ditadas pelo valor dos investimentos; e a outra, das Minutas dos Contratos integrantes dos Editais de Convocação, que fixou nos mesmos 15 (quinze) anos o prazo, excepcionando os casos expressamente previstos no contrato.
Observamos muito bem o que diz o contrato do Pólo de Caxias do Sul, igual aos demais, na cláusula 3.1 – Prazo Total: O prazo da concessão é de 15 (quinze) anos, excepcionados os casos expressamente previstos neste CONTRATO.
Houve um silêncio absoluto sobre a autorização para a prorrogação do prazo contratual, o que equivale afirmar que ela está impedida de acontecer, no caso específico das concessões dos Pólos Rodoviários do RS.
A dilação, quando se justificar, será para restituir os prazos suspensos, na forma das cláusulas 2.3.4, 5.3.6 e 5.3.7 do Contrato (Pólo de Caxias do Sul). Tal circunstância, se ocorrer, será tida como «restituição de prazo» e não como «prorrogação» de contrato administrativo.
É compreensível a decisão dos Deputados. A mesma empresa de consultoria que teria prestado serviços ao DAER ([2]), na elaboração do Programa Estadual de Concessão Rodoviária em 2005, no Estudo contratado pela AGERGS[3], anos depois, reafirmou:
“O programa foi baseado no mecanismo clássico de concessão – BOT (Build-Operate-Transfer), de direito de construção, exploração e prestação de um serviço por período determinado, ao fim do qual o projeto retorna às mãos do Estado.”
A Minuta do Contrato de cada Projeto de Lei dos Pólos preconizou e os Deputados aprovaram: reverterão ao DAER, gratuita e automaticamente, todos os bens adquiridos e integrados à concessão, livres de ônus ou encargos de que tipo forem ao final dos 15 anos.
Face à existência do modelo de pedágios comunitários explorados diretamente pelo DAER, é compreensível, como se disse, que os Deputados daquela legislatura tenham previsto a «reversão» e incorporação de todos os Pólos de concessão ao chamado Modelo Comunitário, por ocasião das extinções dos contratos, ato que têm visível aprovação da sociedade.
De outra parte, expirado o prazo de vigência, sem a previsão expressa de sua prorrogação, dá-se de pleno direito, a extinção do contrato e, se tiver de prosseguir, será exigido novo contrato para dar continuidade à concessão do Pólo, inteiramente desvinculado do extinto, desde que cumprido, novamente, o rito licitatório e de contratação.
CONCLUSÃO:
A Lei 8.987/95 (regente da concessão dos Pólos) e a Lei Estadual 10.086/94 não fixaram prazo máximo para a vigência dos contratos de concessão de serviços públicos. O mesmo ocorreu com a prorrogação do contrato, que embora tenha previsão na Constituição Federal e nas Leis Especiais, não ficou prevista nas Leis Estaduais 10.698; 10.699; 10.699; 10.700; 10.701; 10.702; 10.703; 10.704, 10.705 e 10.706, todas de 12.01.1996.
Para que possa haver prorrogação dos contratos, como se ouve nos meios de comunicação, em 10 (dez) ou 15 (quinze) anos, é necessário que haja previsão expressa em cada uma das leis criadoras e nos contratos dos Pólos de Concessão Rodoviários – PECR-RS, e isso não aconteceu.
Definitivamente, entendemos que os contratos de concessão dos Pólos, por não terem previsão expressa de prorrogação em suas leis criadoras e nos respectivos editais e contratos, não poderão ser prorrogados, ficando mantidas as datas de extinção ao completarem 15 (quinze) anos, excepcionadas as cláusulas que facultam a restituição de prazos suspensos.
Paralelamente ao tema da prorrogação dos Contratos dos Pólos Rodoviários, tornou-se pública outra situação: trata-se da intenção da Administração em alterar os contratos originais para, em troca de obras, serviços e novos investimentos «que não fizeram parte do objeto dos contratos existentes», manter as atuais concessões, dando-lhes um prazo maior de 15 (quinze) anos, a contar dos 6 (seis) anos que ainda faltam, isto é, uma garantia antecipada, sem cogitar a necessidade de nova licitação.
O slogan “Duplica-RS”, do Governo Estadual, parece versar sobre um projeto novo de serviços a serem prestados nas rodovias pedagiadas sob concessão, sem conotação de reequilíbrio econômico e financeiro dos contratos. Aponta para a modernidade e a conseqüente duplicação de trechos rodoviários estratégicos à economia do Estado.
Só se saberá ao certo o que está sendo planificado quando forem expostas, formal e cabalmente, as suas justificativas.
Certamente, a Administração será cautelosa se pretender levar adiante esta pretensão de simplificar as novas contratações, que aparentam abrir margem a vultoso negócio, com risco iminente de cometimento de algum tipo de burla aos princípios da licitação, da probidade administrativa e dos princípios relacionados no art. 37 da Constituição Federal.
Nem mesmo nova lei poderá alterar os contratos existes, modificando seu prazo e objeto, quando conflitante com os prazos e objeto do Edital de Licitação consumado. Não será demais advertir que o Tribunal Pleno do STF, na ADI 2299, de 28.03.2001 - em uma Ação do Rio Grande do Sul, relatada pelo Min. Moreira Alves - entendeu que Lei Estadual não pode alterar as condições da relação contratual entre o poder concedente e as concessionárias.
Portanto, sobre o item 4 da consulta, não é prudente fazer uma análise do que não se tem certeza, razão pela qual restringimo-nos aos conhecidos limites contratuais da Administração Pública, de vinculação à Lei e ao Edital.
Certamente, matéria dessa indagação merece um exame mais aprofundado da comunidade e dos organismos de controle, como a AGERGS, Tribunal de Contas do Estado e Ministério Público, que através de seus órgãos técnicos e eminentes Conselheiros, terão muito a contribuir.
É igualmente legítimo o acompanhamento de organismos não estatais, como a ASSURCON/SERRA, associações de usuários-consumidores, entidades de classe e a imprensa em geral, na busca de publicidade, transparência e na preservação da legalidade e moralidade administrativa.
Caxias do Sul, 17 de abril de 2007.
Gravina Advogados – Sociedade Inscrita na OAB/RS sob n. 329.
Marcus Vinicius Gravina Maurício Salomoni Gravina José Cláudio Gravina Fadanelli
OAB/RS 4.949 OAB/RS 35.984 OAB/RS 56.316
([1]) Leis Estaduais 10.698; 10.699; 10.699; 10.700; 10.701; 10.702; 10.703; 10.704 e 10.706, todas de 12.01.1996.
([2]) Situação a ser esclarecida se ao DAER/ST, ou a quem mais.
([3]) Bourscheid S/A, Empresa de Engenharia Consultiva.
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C O N S U LT A
A Associação dos Usuários de Rodovias Concedidas/Serra – ASSURCON – apresenta uma síntese histórica da instituição do Programa Estadual de Concessão Rodoviária – PECR/RS – e consulta-nos, formulando os seguintes tópicos:
1. Os atuais contratos de concessões rodoviárias recém chegaram à metade do prazo contratado, restando ainda oito anos para seu término;
2. Os contratos foram firmados com data de início e data de término já definidas, sem previsão de prorrogação;
3. Todo o processo das concessões rodoviárias através dos Pólos de pedágios, para nós usuários, foi nebuloso e pernicioso, sendo a prorrogação um dos sonhos, apresentado desde o início das concessões;
4. O fato novo é a atual Administração Estadual ter assumido de fato a condição de procuradora do sempre manifesto desejo das concessionárias dos Pólos de pedágios de ter seus contratos prorrogados pelo maior número de anos possível.
A ASSURCON/SERRA solicita ao Escritório de Advocacia “Gravina Advogados” parecer jurídico que possa embasar ações da mesma junto ao Governo do Estado, a Assembléia Legislativa Estadual e ao próprio Ministério Público.
Ante a estes questionamentos, em temas de contratação administrativa e concessão de serviços públicos, passamos ao exame dos tópicos destacados pela consulente, todos relacionados ao prazo de vigência contratual.
P A R E C E R
O direito à prorrogação do contrato administrativo de concessão de serviço público está relacionado na Constituição Federal, através de um comando ao Poder Público, para disciplinar a matéria através de lei.
Constituição Federal
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos:
Parágrafo único. A lei disporá sobre:
I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; (grifamos)
II – os direitos dos usuários;
III – política tarifária;
IV – a obrigação de manter serviço adequado.”
Em atenção à diretriz constitucional, a Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, ao dispor sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, definiu um conteúdo mínimo, indispensável a esses contratos, considerando cláusula essencial aquela relativa às condições de prorrogação:
Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.
“Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas:
XII – às condições para a prorrogação do contrato;” (grifamos)
Com base na estrutura federativa e na respectiva competência conferida aos Estados, o Rio Grande do Sul editou a sua própria lei sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos (Lei 10.086, de 24 de janeiro de 1994).
Como se observa, um ano antes da Lei nacional, a lei gaúcha (Lei 10.086/1994) contemplou normas sobre as cláusulas essenciais do contrato, admitindo a prorrogação contratual, desde que prevista em lei específica e no edital de licitação:
Lei 10.086, de 24 de janeiro de 1994.
“Art. 6º - Toda a concessão dependerá de lei específica que a autorize e discrimine os seguintes elementos:
I – O prazo da concessão;
...
Art. 9º - São cláusulas essenciais do contrato, no que for aplicável, as relativas a:
...
XII – condições para prorrogação do contrato, desde que previstas no edital de licitação;” (grifamos)
Em acatamento ao disposto no mencionado art. 6º da Lei 10.086/1994, foram aprovadas as leis de concessão dos pólos, que autorizam o Poder Executivo a conceder os serviços de operação, exploração, conservação, manutenção, melhoramentos e ampliação de rodovias integrantes do Sistema Rodoviário Estadual, pertencentes ao denominado Pólo de Concessão Rodoviária, as quais previram prazo de concessão de quinze anos. Por modelo, tomou-se a Lei Estadual 10.705/1996, do Pólo de Caxias do Sul:
Lei 10.705, de 12 de janeiro de 1996.
“Art. 3º O prazo de concessão será de quinze anos.”
Com relação ao prazo de vigência, essa mesma orientação foi mantida nas demais leis do Programa Estadual de Concessão Rodoviária/RS - (Pólos): Leis 10.698; 10.699; 10.699; 10.700; 10.701; 10.702; 10.703; 10.704 e 10.706, todas de 12.01.1996.
Para situar esta consulta no contexto do ordenamento jurídico vigente, destacamos o conjunto de leis acima, que permitem o exame sistematizado de nossas respostas.
Também, à luz desse contexto normativo, passamos à análise dos fatos e atos jurídicos ocorridos no âmbito do programa de concessão de rodovias do Estado do Rio Grande do Sul.
ANÁLISE DOS FATOS
Em 12 de novembro de 1996, O Eng. José Luiz Rocha Paiva, Diretor Geral do DAER, assinou o Edital de Pré-Qualificação 75/96 (Pólo de Caxias do Sul, tomado por exemplo).
No item 3 – Prazo da Concessão –, constou:
“3.1 – O prazo fixado para a concretização do Objeto deste Edital é de 15 (quinze) anos, podendo, contudo, ser prorrogado até igual período, desde que atenda ao interesse público e as necessidades ditadas pelo valor dos investimentos.”
Prestando-se atenção aos demais procedimentos da licitação do Pólo de Caxias do Sul (igual aos demais), nos deparamos com o Edital de Convocação 75/96, da citada Licitação na modalidade de Concorrência, do mesmo Diretor Geral do DAER, com a data de 15 de julho de 1997.
Este o real Edital da Concorrência - de 15.07.1997 - com os seus anexos: Tabela de Pontuação; Minuta do Contrato de Concessão; Estrutura Tarifária; Termo de Referência para Elaboração do Volume 2 da Proposta Técnica; Termo de referência para Elaboração da proposta Comercial; Modelo de Carta de Participação; Modelo de Atestado de Exeqüibilidade Econômico-financeira; Modelo de Carta de Intenção para Captação de Recursos por instituição financeira; Modelo de Atestado de Adequabilidade e Viabilidade do Programa de Seguros; Modelo de Carta de Intenção para Colocação de Papéis; Modelo de Carta de Oferta e Descrição das Rodovias que compõem o objeto da licitação.
Quanto ao prazo do contrato, o Edital de Convocação 75/96 deixou de mencionar expressamente a sua fixação e as condições para a prorrogação, remetendo o dispositivo para a Minuta do Contrato, anexa.
A Minuta do Contrato, ao contrário do que havia sido previsto no item 3.1 do Edital de Pré-Qualificação 75/96, deu nova redação:
“3- Prazos de Concessão
3.1 – Prazo Total: O prazo da concessão é de 15(quinze) anos, excepcionados os casos expressamente previstos neste CONTRATO.”
O Contrato de Concessão do Pólo de Caxias do Sul (tomado por exemplo) foi celebrado em 14 de abril de 1998, conforme acima transcrito, definindo o prazo de quinze anos, com exceção para outros casos expressamente previstos no instrumento contratual.
Conseguimos identificá-los como sendo os das seguintes cláusulas contratuais:
“2.3.4 – Os prazos suspensos serão restituídos, procedendo-se os ajustes necessários nos cronogramas das obras e dos serviços afetados;” (grifamos)
“5.3.6 – Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso da Concessionária, quando motivada:
I- por razões de segurança de pessoas e bens;
II- caso fortuito ou força maior.” (grifamos)
“5.3.7- A interrupção da prestação do serviço nos casos aludidos no item anterior não implica em prorrogação da concessão, salvo no caso do inciso II, com a ocorrência da prorrogação pelo mesmo tempo de interrupção.” (grifamos)
As exceções retro não cuidam de prorrogação de prazo. Trata-se de cláusulas de «restituição de prazo», para o fim de assegurar o cumprimento da integralidade dos 15 (quinze) anos de concessão.
Tais hipóteses encontram amparo nas leis de Concessões e de Licitações, e estão reservadas para situações anômalas, excepcionais, eventos invulgares, ou então as decorrentes das chamadas sujeições imprevistas «teoria da imprevisão», desde que não haja alteração do objeto do contrato. Sua adaptação, nesses casos, independe de autorização da Assembléia Legislativa ou de previsão contratual.
Isso mostra que tais exceções não correspondem ao tipo de «prorrogação de contratos administrativos» citada na Constituição Federal e nas Leis que fundamentam este parecer.
Não encontramos nenhuma outra hipótese de alteração ou prorrogação no contrato. Sendo assim, os mesmos deverão se extinguir quando completarem os 15 (quinze) anos de vigência contratual.
DA PREVALÊNCIA DAS LEIS ESTADUAIS DOS PÓLOS
Sobrepondo-se a esta análise dos instrumentos contratuais, estão as Leis Estaduais, criadoras de cada um dos Pólos ([1]).
Estas leis, além de definirem com precisão o objeto de cada um dos contratos de concessão, fixaram o termo final de forma estanque, definindo o prazo de quinze anos, sem admitir prorrogação.
Assim, a autorização legal conferida pela Assembléia Legislativa, a ser cumprida pelo DAER na publicação do Edital de Concorrência, foi rígida ao dispor o prazo de 15 (quinze) anos para cada um dos contratos (modelo do estudo – Lei 10.705/96, art. 3º).
LEI N. 10.705, DE 12 DE JANEIRO DE 1996
Autoriza o Poder Conceder Executivo a conceder os serviços de operação e exploração, conservação, manutenção, melhoramentos e ampliação de rodovias integrantes do Sistema Rodoviário Estadual e pertencentes ao complexo de obras ou serviços denominado Pólo de Concessão Rodoviária – Caxias do Sul/RS.
Cópia desta Lei foi juntada a este parecer. A sua leitura elucidará muitas dúvidas.
Cumpria ao DAER, na cláusula contratual sobre o prazo, transcrever, integralmente, o que a Lei determinou e nada mais:
“Art. 3º. O prazo da concessão será de quinze anos”
De tal forma, alterações produzidas pelo DAER - no Edital e nos contratos celebrados -, após a explicitada e restritiva autorização legislativa, estão sujeitas a exame, para apurar a sua ineficácia ou nulidade.
O legislador, diante do projeto de lei do Executivo e de todos os anexos elaborados pelo DAER, não quis e não manifestou nenhuma intenção de permitir a prorrogação dos contratos.
Essa intenção restritiva ficou clara nas Leis criadoras dos Pólos. Das duas propostas iniciais do DAER, nenhuma teve aprovação dos Deputados: a primeira, dos editais de pré-qualificação, que pretendeu a prorrogação por igual período, desde que atendesse ao interesse público e as necessidades ditadas pelo valor dos investimentos; e a outra, das Minutas dos Contratos integrantes dos Editais de Convocação, que fixou nos mesmos 15 (quinze) anos o prazo, excepcionando os casos expressamente previstos no contrato.
Observamos muito bem o que diz o contrato do Pólo de Caxias do Sul, igual aos demais, na cláusula 3.1 – Prazo Total: O prazo da concessão é de 15 (quinze) anos, excepcionados os casos expressamente previstos neste CONTRATO.
Houve um silêncio absoluto sobre a autorização para a prorrogação do prazo contratual, o que equivale afirmar que ela está impedida de acontecer, no caso específico das concessões dos Pólos Rodoviários do RS.
A dilação, quando se justificar, será para restituir os prazos suspensos, na forma das cláusulas 2.3.4, 5.3.6 e 5.3.7 do Contrato (Pólo de Caxias do Sul). Tal circunstância, se ocorrer, será tida como «restituição de prazo» e não como «prorrogação» de contrato administrativo.
É compreensível a decisão dos Deputados. A mesma empresa de consultoria que teria prestado serviços ao DAER ([2]), na elaboração do Programa Estadual de Concessão Rodoviária em 2005, no Estudo contratado pela AGERGS[3], anos depois, reafirmou:
“O programa foi baseado no mecanismo clássico de concessão – BOT (Build-Operate-Transfer), de direito de construção, exploração e prestação de um serviço por período determinado, ao fim do qual o projeto retorna às mãos do Estado.”
A Minuta do Contrato de cada Projeto de Lei dos Pólos preconizou e os Deputados aprovaram: reverterão ao DAER, gratuita e automaticamente, todos os bens adquiridos e integrados à concessão, livres de ônus ou encargos de que tipo forem ao final dos 15 anos.
Face à existência do modelo de pedágios comunitários explorados diretamente pelo DAER, é compreensível, como se disse, que os Deputados daquela legislatura tenham previsto a «reversão» e incorporação de todos os Pólos de concessão ao chamado Modelo Comunitário, por ocasião das extinções dos contratos, ato que têm visível aprovação da sociedade.
De outra parte, expirado o prazo de vigência, sem a previsão expressa de sua prorrogação, dá-se de pleno direito, a extinção do contrato e, se tiver de prosseguir, será exigido novo contrato para dar continuidade à concessão do Pólo, inteiramente desvinculado do extinto, desde que cumprido, novamente, o rito licitatório e de contratação.
CONCLUSÃO:
A Lei 8.987/95 (regente da concessão dos Pólos) e a Lei Estadual 10.086/94 não fixaram prazo máximo para a vigência dos contratos de concessão de serviços públicos. O mesmo ocorreu com a prorrogação do contrato, que embora tenha previsão na Constituição Federal e nas Leis Especiais, não ficou prevista nas Leis Estaduais 10.698; 10.699; 10.699; 10.700; 10.701; 10.702; 10.703; 10.704, 10.705 e 10.706, todas de 12.01.1996.
Para que possa haver prorrogação dos contratos, como se ouve nos meios de comunicação, em 10 (dez) ou 15 (quinze) anos, é necessário que haja previsão expressa em cada uma das leis criadoras e nos contratos dos Pólos de Concessão Rodoviários – PECR-RS, e isso não aconteceu.
Definitivamente, entendemos que os contratos de concessão dos Pólos, por não terem previsão expressa de prorrogação em suas leis criadoras e nos respectivos editais e contratos, não poderão ser prorrogados, ficando mantidas as datas de extinção ao completarem 15 (quinze) anos, excepcionadas as cláusulas que facultam a restituição de prazos suspensos.
Paralelamente ao tema da prorrogação dos Contratos dos Pólos Rodoviários, tornou-se pública outra situação: trata-se da intenção da Administração em alterar os contratos originais para, em troca de obras, serviços e novos investimentos «que não fizeram parte do objeto dos contratos existentes», manter as atuais concessões, dando-lhes um prazo maior de 15 (quinze) anos, a contar dos 6 (seis) anos que ainda faltam, isto é, uma garantia antecipada, sem cogitar a necessidade de nova licitação.
O slogan “Duplica-RS”, do Governo Estadual, parece versar sobre um projeto novo de serviços a serem prestados nas rodovias pedagiadas sob concessão, sem conotação de reequilíbrio econômico e financeiro dos contratos. Aponta para a modernidade e a conseqüente duplicação de trechos rodoviários estratégicos à economia do Estado.
Só se saberá ao certo o que está sendo planificado quando forem expostas, formal e cabalmente, as suas justificativas.
Certamente, a Administração será cautelosa se pretender levar adiante esta pretensão de simplificar as novas contratações, que aparentam abrir margem a vultoso negócio, com risco iminente de cometimento de algum tipo de burla aos princípios da licitação, da probidade administrativa e dos princípios relacionados no art. 37 da Constituição Federal.
Nem mesmo nova lei poderá alterar os contratos existes, modificando seu prazo e objeto, quando conflitante com os prazos e objeto do Edital de Licitação consumado. Não será demais advertir que o Tribunal Pleno do STF, na ADI 2299, de 28.03.2001 - em uma Ação do Rio Grande do Sul, relatada pelo Min. Moreira Alves - entendeu que Lei Estadual não pode alterar as condições da relação contratual entre o poder concedente e as concessionárias.
Portanto, sobre o item 4 da consulta, não é prudente fazer uma análise do que não se tem certeza, razão pela qual restringimo-nos aos conhecidos limites contratuais da Administração Pública, de vinculação à Lei e ao Edital.
Certamente, matéria dessa indagação merece um exame mais aprofundado da comunidade e dos organismos de controle, como a AGERGS, Tribunal de Contas do Estado e Ministério Público, que através de seus órgãos técnicos e eminentes Conselheiros, terão muito a contribuir.
É igualmente legítimo o acompanhamento de organismos não estatais, como a ASSURCON/SERRA, associações de usuários-consumidores, entidades de classe e a imprensa em geral, na busca de publicidade, transparência e na preservação da legalidade e moralidade administrativa.
Caxias do Sul, 17 de abril de 2007.
Gravina Advogados – Sociedade Inscrita na OAB/RS sob n. 329.
Marcus Vinicius Gravina Maurício Salomoni Gravina José Cláudio Gravina Fadanelli
OAB/RS 4.949 OAB/RS 35.984 OAB/RS 56.316
([1]) Leis Estaduais 10.698; 10.699; 10.699; 10.700; 10.701; 10.702; 10.703; 10.704 e 10.706, todas de 12.01.1996.
([2]) Situação a ser esclarecida se ao DAER/ST, ou a quem mais.
([3]) Bourscheid S/A, Empresa de Engenharia Consultiva.
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